UMA INCRÍVEL PITADA DE EMPODERAMENTO FEMININO

Os Incríveis 2, a estreia que mais aguardamos, uma vida inteira!


Assim como esperamos bastante tempo por esse filme (13 anos!), estou aqui para falar dele. Duas semanas depois de ter assistido! Enfrentei dificuldades de fugir do comum, pois a internet já no dia da estreia estava lotada de críticas e resenhas do filme. Impossível competir ou produzir algo que seja relevante e traga discussões pertinentes. E digamos que no assunto de temas para discussão, Os Incríveis 2 (Brad Bird, 2018) abre diversas portas!
Passei muito tempo pesquisando e acabei me estendendo um pouco (já nem é comum, certo?) e percebi que há muito a que se falar sobre...


Brad Bird

Mas antes, como alguns já sabem, esse novo filme da Pixar parte exatamente do ponto em que terminou o primeiro. Uma continuação fiel e sem pular no tempo, já que se o fizesse sairia do princípio empregado pelo diretor e escritor, Brad Bird, que já tinha tudo planejado desde o ano seguinte ao lançamento do primeiro filme. Ele já contava com os holofotes em Helena Pera, colocando as mulheres em primeiro plano em alguns aspectos, ainda que não tenha conseguido fugir muito do machismo (explorarei mais a fundo nos próximos parágrafos), mas manteria os conceitos expostos por cada poder dos personagens. Seguindo a seguinte lógica: temos a Helena com a elasticidade por ser mãe e lidar com várias coisas ao mesmo tempo; Beto, o pai, espera-se dele, ressalta o diretor que por ser um homem, que seja forte; já Violeta, a adolescente, insegura e que vive na defensiva, tem a invisibilidade e o campo de força; o Flecha, uma criança cheia de energia e incontrolável, tem a capacidade de correr muito rápido; já o Zezé, um dos focos desse segundo filme, com personalidade desconhecida por ser um bebê, é uma surpresa quanto seus poderes (que já havíamos tido uma prévia no final do primeiro filme!).




Toda sua explicação de manter como continuidade faz sentido, ainda que não concorde plenamente com o que é explicado sobre Beto.
A família Pera, recém-saída de suas tentativas de se esconder em sua vida “normal” e considerada “não-super”, triscam o pé para fora e voltam correndo, pois a política quer fazer de tudo para colocar os heróis como escórea da sociedade, que mais destroem do que ajudam e que ainda são indesejáveis. E tudo muda quando um empresário quer apostar na volta deles, tendo como escolha a Mulher Elástico, por apresentar um bom desempenho em suas missões, o que deixa o Sr. Incrível com o ego ferido. Um ponto para o machismo representado nas telas!

Apesar dessa recorrente triste realidade (em nossas vidas e nos filmes, incluso nesse), temos uma tentativa de redenção ao inverter os papéis. Com Helena tendo de ficar fora para melhorar a imagem dos heróis, Roberto terá de cuidar da casa e dos filhos. Conforme sua esposa sucede em seu trabalho, vemos um Sr. Incrível frustrado e tentando conciliar tudo. E é legal pegar um gancho do primeiro filme, em que Beto sacrifica tudo pelos seus “Dias de Glória”, vivendo do passado onde ele tinha grandes feitos e honrava seu nome de super herói. Vemos, assim, um certo egocentrismo dele ainda presente em não aceitar que sua mulher desempenhe algum feito tão magnífico quanto o dele, podendo, ainda assim, ser levado como uma forma de colocar sua mulher para trás. E, para mim, não ficou claro se foi uma tentativa de desconstrução do personagem masculino, do estilo “vem aqui, tarefa de casa e cuidar das crianças é igualmente difícil” ou se tal discussão foi colocada em evidência na história como forma de deliciar a plateia com risadas (o que, infelizmente, aconteceu algumas vezes ao longo da sessão).





Claro que tirando toda a técnica, o filme parece contestar alguns conceitos feministas e plantou dúvidas em certas interpretações, também. Mas toda a estética do filme, a modelagem, texturização e outros aspectos de animação ficaram incríveis e condizem com o título! O ritmo dado ao filme me prendeu inteiramente ao enredo, muito mais que ao primeiro. Como muitos puderam afirmar e eu concordo, foram duas horas longas e muito bem feitas e aproveitadas, pois eu queria continuar no cinema e esperar começar de novo. Com todas as piadas, principalmente as tiradas de Flecha (ri muito com ele) e os momentos com a Edna Modes (adoro ela!), temos um equilíbrio entre os momentos de ação com os mais leve e sútis, como os momentos em família. E Bird enfrentava um desafio em meio a tantos filmes de super heróis da atualidade, competindo sem medo, certamente, pois fugiu da mesmice e conseguiu contornar tal obstáculo.


Edna Modes: "Há poucas coisas mais heróicas no mundo do que ser pai. Quando faz direito!"




As mulheres nesse filme foram evidenciadas de certa forma, com personagens como Evelyn, Void, Edna, Violeta e Helena... uma espécie de contraponto de todo o machismo que falei até agora. E, mesmo com todos os pontos que gostaria de levantar (mas daria spoilers), acabou se tornando um ponta pé inicial para mostrar para crianças o espaço da mulher na sociedade, andando na contramão de muitos filmes que retratam famílias. Em que na década passada, 80% dos filmes são de homens (pais) bem sucedidos que saem de casa para trabalhar e sustentar a família, enquanto a esposa cuida da casa e dos filhos. Não há a divisão de tarefas nem mesmo a inversão de papéis. No meu consentimento, gosto muito mais da primeira ideia, de os dois trabalham fora e em casa, sem a sobrecarga de nenhum. Pois um ponto que levantamos, eu e minha mãe ao conversarmos sobre o filme, é o de como a mulher se desdobra muito, tornando toda sua tarefa imposta pela sociedade envolvida em cuidar da casa sozinha e trabalhar fora. Pois, na realidade, só nos EUA 50% do mercado é feminino. No Brasil as mulheres trabalham três horas a mais que os homens, estudam mais, ocupam muitos cargos, mas ainda são menos valorizadas que os homens, tanto em seu trabalho (silenciada, por vezes) quanto por seu salário (em média menor que de um homem no mesmo cargo). Portanto, o filme mostrar isso, ainda que forcemos um pouquinho só a interpretação, já funciona muito bem.




Na atual era em que a mulher vem ganhando voz, tendo personagens com a devida atenção e desenvolvimento, ver Helena independente e colocada numa atmosfera de mulheres em contato com o feminismo trouxe uma esperança para mim enquanto assistia ao filme, após as pontadas das atitudes de Beto. Está nessa e outras formas da Disney e da Pixar de explorar personagens femininas fortes, desde Elsa até Moana, como as principais de sua narrativa. Algo que ambas empresas vêm trabalhando, a representatividade de gênero e de culturas. Como é o caso do curta antes de Os Incríveis 2, Bao, que gerou muitas dúvidas nos expectadores, mas que tem na direção e no roteiro Domee Shi, de origem chinesa, expressado um pouco da cultura e da vida de descendentes que vivem na Chinatown de Toronto. Além de ser uma representatividade chinesa, foi também uma boa representatividade para Toronto que aparece como ele mesmo nas filmagens! Brincadeiras à parte sobre o incrível Canadá (para quem não entendeu, recomendo muito esse vídeo que explica sobre as filmagens feitas em Vancouver de histórias que se passam em outras cidades dos EUA), o curta consegue mostrar seu diferencial.




Foi um curta bem interessante de acompanhar, por se tratar de um tema envolvendo família, preparava levemente o solo para o que viria em seguida, só que com uma temática um pouco diferente. Domee Shi confessou ter se inspirado muito em sua mãe, que até foi aos estúdios da Pixar para ensinar a fazer o bolinho cozinhado em cena, o símbolo de todo cuidado que uma mãe tem com seu filho para então deixa-lo, como bem dizia a Elsa, “let it go”. No caso é deixa-lo ir viver a própria vida, trilhar seu caminho para o possível sucesso ou o fracasso. Um pouquinho difícil de entender, à princípio, mas com uma abordagem diferenciada e interessante para o assunto.




Por fim, voltando aos Incríveis 2, o vigésimo filme da Pixar e o mais longo computadorizado, vemos nele um pequeno reaproveitamento de alguns aspectos do primeiro. Como situações vividas pelo Sr. Incrível do primeiro filme replicados à Mulher Elástico do segundo, como uma espécie de reaproveitamento da fórmula, intencionalmente ou não, formando um certo paralelo entre as histórias. E apesar de ambos decidirem arriscarem seus valores mais uma vez, vemos a indefinição do posicionamento dos heróis em sociedade... Em que se cobra muito da perfeição de seus atos e das consequências deles, chegando a lembrar muito mais uma espécie de fanatismo além daquele sentido pelo Síndrome (ou famigerado Bochecha), como também uma cobrança ideal e um tanto hipócrita do governo que nem mesmo consegue garantir sozinho isso tudo.





Ainda que com abordagens pinceladas ao longo da história, temos certos problemas da pós-modernidade expressos pelo filme, mas muito bem abordados em diversas críticas. Recomendarei algumas ao fim do post! Vemos Brad Bird entregar algo que já contávamos estar com selo de qualidade Pixar, sem enganos com o resultado e sem dor no bolso por ter gasto com o ingresso. Vale tanto a pena ir assistir que somos capazes de perdoar o leve atraso que o diretor deixou passar, por prezar a qualidade e não fazer dessa história mais uma franquia qualquer.


novos super heróis apresentados no segundo filme.


Já foi conferir esse filme? Caso ainda não tenha, recomendo não perder a oportunidade de ouvir piadinhas sobre o Acre nem mesmo as falas de Raul Gil na dublagem! 


Evaristo faz um jornalista, Otaviano Costa e Flavia Alessandra fazem os irmãos e Raul Gil um herói (que não revelarei!)


Espero que tenham gostado do post! (E perdoem a demora por sair!). Comente o que achou do filme para discutirmos e não deixe de compartilhar com quem você sabe que curte esse tipo de conteúdo. Estamos no Facebook, Twitter e Instagram (soltando umas brincadeiras nos stories também, confiram!).
Até a próxima olhada!

Obs: queria ter encontrado os dubladores brasileiros de cada personagem, mas não encontrei...

Indico ler/assistir também: 
Os Incríveis 2 (crítica) | Cinema em Cena
O Sr. Incrível é Machista? | Igor Saringer 
How Incredibles 2 goes to work for the Feminist Super Hero | The Guardian

Agradecimentos: Bia, Anna, Dione e Eduardo que contribuíram muito para essa discussão florescer!

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